CRM denuncia redução de cirurgias cardíacas pediátricas
22/11/2017
A enorme fila para as cirurgias cardíacas pediátricas (CCPs) no Estado do Rio de Janeiro motivou o CREMERJ a convocar uma coletiva de imprensa nessa quarta-feira, 22. Com o fechamento do serviço em quatro unidades ao longo dos últimos anos, hoje apenas três hospitais realizam os procedimentos e não conseguem dar conta da demanda, tendo sido, inclusive, obrigados a reduzir drasticamente as intervenções cirúrgicas devido à falta de verbas, insumos, estrutura, leitos e funcionários especializados.
Atualmente, apenas o Instituto Nacional de Cardiologia (INC), o Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro (Iecac) e a Perinatal da Barra da Tijuca (por contrato com a Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro) atendem os pacientes infantis com cardiopatias.
Durante a coletiva, o diretor do CREMERJ e coordenador do Comitê de Monitoramento da Cirurgia Cardíaca Pediátrica (CMCCP), Serafim Borges, fez uma apresentação com dados sobre a situação das CCPs no Estado. O levantamento, baseado em fiscalizações do CRM, revelou que o número de cirurgias cardíacas pediátricas caiu consideravelmente, resultando na desassistência das crianças com algum tipo de patologia no coração.
O CMCCP, criado em outubro de 2016, recebeu as denúncias e fez uma pesquisa para verificar os principais motivos para a redução dos procedimentos. As vistorias, que aconteceram de setembro a outubro deste ano, também tiveram a participação da Comissão de Fiscalização (Cofis) da entidade. Nas visitas, foi constatado que há falta de profissionais especializados, infraestrutura e carência de suporte adequado em CTIs para o pós-operatório, ocasionados pela má gestão e não repasse de verbas.
O déficit de cirurgias também leva à longa a demora para a realização delas. “É fundamental reduzir esse tempo de espera e é importante corrigir problemas, como a falta de recursos humanos e a ausência de vagas em CTIs. O número dessas cirurgias precisa aumentar. Em julho, o Ministério da Saúde lançou um programa que prometia aumentar em 30% as cirurgias pediátricas no Sistema Único de Saúde (SUS), mas ainda não vimos nenhum resultado. As vistorias, infelizmente, só mostraram a diminuição do serviço”, destacou Serafim Borges.
Apesar de o Estado não possuir dados oficiais relacionados a cardiopatias na infância, segundo o DataSUS de 2014, 29.800 crianças apresentavam doenças estruturais do coração. Destas, 20% têm remissão espontânea, sobrando 23.840 crianças que acabam ficando sem assistência. Deste total, 35% vão a óbito. Os números mostram que a falta de atendimento é um problema antigo em todo país, mas, no Rio de Janeiro, vem se agravando.
O Estado contava, no passado, com os hospitais federais dos Servidores do Estado e de Bonsucesso e com os universitários federal Clementino Fraga Filho (Hospital do Fundão) e estadual Pedro Ernesto para a realização das CCPs.
“É uma situação muito grave. Esperamos que esse levantamento chame a atenção das autoridades, para que esse quadro mude. As crianças não podem continuar sem a assistência necessária”, disse o presidente do Conselho, Nelson Nahon, durante a coletiva.
As fiscalizações foram encaminhadas pelo CREMERJ à Defensoria Pública, ao Ministério Público, à SES-RJ e ao Ministério da Saúde para que sejam tomadas as medidas necessárias para que a fila das CCPs seja zerada e que nenhuma criança tenha que esperar pelos procedimentos.
Veja os principais pontos encontrados em cada unidade durante as vistorias do CREMERJ sobre o serviço de cirurgia cardíaca pediátrica no Estado:
Instituto Nacional de Cardiologia (INC)
Fiscalizado em 17 de outubro, um dos principais motivos para a suspensão de cirurgias cardíacas pediátricas no INC é o fechamento constante do centro de cirúrgico, causado, na maioria das vezes, pela falta de recursos humanos. Há falta de cardiologistas pediátricos, intensivistas, cirurgiões cardíacos, enfermeiros especializados, fisioterapeutas e psicólogos. O problema vem piorando em função da não renovação dos contratos temporários do Ministério da Saúde.
Na unidade, há uma fila de 200 crianças que aguardam pela cirurgia. Na enfermaria, de 24 leitos disponíveis, apenas 18 estão funcionando, devido ao número reduzido de enfermeiros. Dos 12 leitos pediátricos e neonatais, apenas um é adequado para transplante cardíaco. Por mês, são realizadas, em média, 30 cirurgias no INC.
Equipamentos e insumos também são insuficientes.
Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro (Iecac)
Durante a fiscalização ocorrida em 19 de setembro no Iecac, foi constatado que a ala pediátrica da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do instituto atuava com número reduzido. Dos nove leitos existentes, apenas cinco estavam em funcionamento. Já na terapia intensiva há cinco leitos, no entanto somente um está ativo. Por mês, são realizadas, em média, cinco CCPs.
A falta de recursos humanos, principalmente de plantonistas e de enfermeiros, e o alto índice de infecções hospitalares têm causado a suspensão de cirurgias. A ausência de plantonistas chega a quase 43% e a de profissionais de enfermagem, a 70%.
Há déficit de cardiologistas pediátricos, cirurgiões cardíacos, hemodinamicistas, fisioterapeutas e anestesistas. Devido à falta de materiais, o setor de hemodinâmica e o laboratório da unidade estão inoperantes. Outro fator que tem contribuído para a diminuição de cirurgias é a ausência de insumos, além da manutenção de equipamentos.
Perinatal da Barra da Tijuca
Conveniada pela Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ) para realizar cirurgias cardíacas neonatais e pediátricas pelo SUS, a Perinatal Barra foi fiscalizada em 31 de outubro, quando foi constatado que o número dos procedimentos caiu consideravelmente, em razão da dívida que o Estado tem com a unidade. Segundo a direção, o valor atinge R$ 4 milhões e o último repasse financeiro feito pela SES-RJ à Perinatal foi relativo ao pagamento dos procedimentos realizados em abril.
Na unidade, as CCPs feitas pelo convênio com o SUS representava de 50% a 60% da produtividade, chegando a 30 cirurgias por mês. Atualmente, os procedimentos totalizam apenas 15%, com uma média de cinco operações mensais. Em setembro, por exemplo, foram realizadas cinco cirurgias pelo SUS e, em outubro, apenas duas.