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RECOMENDAÇÃO CREMERJ Nº 05/2020 

 

Recomenda a utilização de critérios objetivos e transparentes para estabelecer prioridades na alocação dos pacientes em leitos de terapia intensiva e suas intervenções diante de período de esgotamento de recursos provocado pela epidemia do novo Coronavírus (Covid-19), desde que ofereça assistência integral de prevenção e alívio do sofrimento aos pacientes não eleitos.

 

O CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, no uso das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268/57 e pelo Decreto nº 44.045/58, e

CONSIDERANDO o atual cenário da doença provocada pelo novo Coronavírus (SARS-CoV-2), também chamada de COVID-19, classificado como pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS), e tendo o Senado Federal brasileiro, através do Decreto Legislativo no 6, de 20 de março de 2020, para os fins do art. 65 da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, reconhecido o estado de calamidade pública no Brasil;

CONSIDERANDO que o estado do Rio de Janeiro reconheceu a situação de emergência em saúde por meio do Decreto nº 46.973, de 16 de março de 2020 (Modificado pelo Decreto nº 47.006, de 27/03/2020);

CONSIDERANDO a necessidade de regulamentação, no estado do Rio de Janeiro, da Lei federal n° 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do novo Coronavírus, responsável pelo surto de 2019;

CONSIDERANDO o Art. 1° do Decreto nº 47.052, de 29/04/2020, que estabelece novas medidas temporárias de prevenção ao contágio e de enfrentamento da emergência em saúde pública de importância internacional, decorrente do novo Coronavírus, agente etiológico da COVID-19, bem como, reconhece a necessidade de manutenção da situação de emergência no âmbito do estado do Rio de Janeiro;

CONSIDERANDO a alta taxa de transmissibilidade do vírus e o exponencial número de pacientes que vêm sendo infectados diariamente no estado do Rio de Janeiro, o que demonstra uma inevitável sobrecarga de recursos da saúde, de acordo com os registros dos órgãos oficiais dos estados;

CONSIDERANDO a necessidade de implementação de ações coordenadas nas unidades hospitalares públicas e privadas;

CONSIDERANDO que entre os princípios fundamentais do Código de Ética Médica, aprovado pela Resolução CFM nº 2.217/2018, está estabelecido que a medicina será exercida com a utilização dos meios técnicos e científicos disponíveis que visem aos melhores resultados;

CONSIDERANDO os artigos 32 e 34 do Código de Ética Médica:

Art.  32. Deixar  de  usar  todos os  meios  disponíveis  de promoção  de  saúde  e  de  prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente. [...]

Art.  34. Deixar  de  informar  ao  paciente  o  diagnóstico,  o  prognóstico,  os  riscos  e  os  objetivos  do tratamento,  salvo  quando  a  comunicação  direta  possa  lhe  provocar  dano,  devendo,  nesse  caso, fazer a comunicação a seu representante legal.

CONSIDERANDO a Resolução do CFM 2.156/2016 que estabelece os critérios de admissão e alta em unidade de terapia intensiva;

CONSIDERANDO o Capítulo V, artigo 41 do Código de Ética Médica que diz ser vedado ao médico "abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal";

CONSIDERANDO que as doenças graves e degenerativas podem evoluir para condição de terminalidade e o uso de da terapia intensiva além de não trazer benefício poderá levar à distanásia;

CONSIDERANDO a Resolução CFM nº 1.805/2006 que permite ao médico na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis, limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, respeitando a vontade do paciente ou de seu representante legal;

CONSIDERANDO a Recomendação do CFM nº 08/2015 que estimula a criação de comitês de bioética;

CONSIDERANDO a Resolução CFM nº 1.995/2012 que versa sobre as diretivas antecipadas de vontade;

CONSIDERANDO a existência na literatura médica mundial de escores de estratificação do grau de gravidade das disfunções orgânicas,  dentre eles o Sequential Organ Failure Assessment (SOFA) de avaliação de prognóstico a curto prazo e direcionamento de intervenções terapêuticas;

CONSIDERANDO que pessoas acometidas por uma mesma doença podem apresentar funcionalidades completamente distintas e que esta deve ser fator prognóstico decisivo para tomada de decisão clínica e proporcionalidade terapêutica; que a funcionalidade do paciente, independentemente de sua faixa etária, deve ser verificada, tendo como referência o PS-ECOG (Eastern Cooperative Oncology Group), já bastante utilizada na assistência;   

CONSIDERANDO que a indicação da necessidade de internação em unidade de terapia intensiva é prerrogativa exclusiva do médico, devendo-se guiar por critérios técnicos existentes;

CONSIDERANDO que não cabe ao médico correlacionar a necessidade de internação com a existência de vagas. O provimento de vagas suficientes é dever do poder público, conforme expressa previsão constitucional que a “saúde é um direito de todos e dever do estado”;

CONSIDERANDO, finalmente, o decidido na 217ª Sessão Plenária do Corpo de Conselheiros, realizada no dia 14 de maio de 2020,

 

RECOMENDA:

 

1. A data de início e término da situação de crise e esgotamento de recurso deverá ser declarada formalmente pelo governo do estado e/ou prefeituras na condição de suas secretarias de saúde e pelos diretores técnicos de cada instituição.

1.1. Garantir que todos os esforços para ampliação de leitos, recursos humanos e materiais foram realizados, antes da declaração de escassez do recurso.

2. Utilização de protocolos com critérios transparentes e objetivos, pelas instituições de saúde do estado do Rio de Janeiro, para o estabelecimento de prioridades na alocação dos pacientes em terapia intensiva e seus recursos, somente enquanto durar o período de escassez.

2.1. Os critérios devem buscar a melhor análise através de ferramentas cientificamente consagradas que visam a avaliação do potencial benefício das medidas intensivas e seus recursos.

2.2. Os critérios mais recomendados para a triagem inicial são a gravidade clínica durante a avaliação que deverá ser mensurada pelo instrumento SOFA (Sequential Organ Failure Assessment) escore; a gravidade das doenças de base incuráveis e progressivas se houver. São elas: as demências, as disfunções orgânicas (renal, pulmonar e hepatica), câncer e a síndrome de fragilidade que podem ter como base a ferramenta nomeada SPICT-BR (Supportive and Palliative Care Indicators Tool – versão brasileira); e a funcionalidade prévia à admissão na unidade de saúde a ser medida pela ferramenta PS-ECOG escore (Eastern Cooperative Oncology Group). Considera-se que: a) quanto maior for a gravidade clínica inicial; b) quanto mais graves forem as comorbidades; e c) quanto mais reduzida for a funcionalidade do paciente, menores as chances de que ele se beneficie de medidas intensivas e seus recursos.

2.3. Para as pessoas portadoras de deficiência física ou intelectual não deverá ser utilizado o critério da funcionalidade.

2.4. Não utilizar, em hipótese alguma, a faixa etária como critério.

3. Formação de equipes de triagem que sejam as responsáveis pela aplicação do protocolo;

3.1.  A composição dessas equipes ficará a critério de cada instituição;

3.2. Deverá haver médicos com, no mínimo, cinco anos de formado;

3.3. Os profissionais envolvidos não deverão estar na assistência direta dos pacientes que forem avaliados;

3.4.  A consulta dessas equipes poderá ser feita remotamente.

4. Em contextos de maior conflito bioético na tomada de decisão deverá haver o envolvimento das comissões de ética médica institucional e/ou de bioética, se houver.

5. A manifestação prévia de vontade do paciente deverá ser estimulada, devendo o paciente ser informado que sua vontade só poderá ser cumprida se houverem recursos disponíveis, após análise dos critérios técnicos.

6. É necessário um seguimento dos pacientes alocados aos recursos de terapia intensiva, para que a identificação de falência ao tratamento não seja tardia e se evite a distanásia.

7.  Aos pacientes que não forem elegíveis para cuidados de terapia intensiva, por manifestação de vontade ou pela indisponibilidade do recurso, deverá ser oferecido cuidado digno e integral que vise a prevenção e o alívio do sofrimento.

8. Maior disponibilização de fármacos como opióides, benzodiazepínicos, antipsicóticos e anticolinérgicos, institucional ou comercial, para que sejam promovidos, de forma impecável, o controle de sintomas físicos aos pacientes que evoluam para a terminalidade da vida.

 

 

Rio de Janeiro, 14 de maio de 2020.

 

 

 

 

SYLVIO SERGIO NEVES PROVENZANO

Presidente

 

 

RICARDO FARIAS JÚNIOR

Diretor Primeiro Secretário

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS:

 

BRASIL. Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Diário Oficial da União de 7 fev. 2020. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L13979.htm. Acesso em 13 mai. 2020.

BRASIL. Senado Federal. Decreto Legislativo nº 06, de 20 de março de 2020. Reconhece, para os fins do art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem nº 93, de 18 de março de 2020.  Diário Oficial da União de 20 de mar. 2020. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/portaria/DLG6-2020.htm Acesso em: 13 mai 2020.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA.  Resolução CFM nº 1.995, 9 de agosto de 2012. Dispõe sobre as diretivas de vontade dos pacientes. Diário Oficial da União de 31 ago. 2012. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2012/1995. Acesso em 13 mai. 2020.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Recomendação CFM nº 8, de 12 de março de 2015. Recomenda a criação, o funcionamento e a participação dos médicos nos Comitês de Bioética. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/recomendacoes/BR/2016/2. Acesso em: 13 mai. 2020.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM nº 1.805, de 9 de novembro de 2006. Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal. Diário Oficial da União de 28 nov. 2006. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2006/1805. Acesso em: 13 mai.2020.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM nº 2.156, de 28 de outubro de 2016. Estabelece os critérios de admissão e alta em unidade de terapia intensiva. Diário Oficial da União de 17 nov. 2016. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2016/2156. Acesso em 13 mai.2020.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM nº 2.217, de 27 de setembro de 2018. Aprova a Código de Ética Médica. Diário Oficial da União de 1º nov. 2018. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2018/2217>. Acesso em 3 mai. 2020.

ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DE SAÚDE. OPAS BRASIL. OMS afirma que COVID-19 é agora caracterizada como pandemia. Em 11 mar. 2020. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6120:oms-afirma-que-covid-19-e-agora-caracterizada-como-pandemia&Itemid=812. Acesso em: 11 mai. 2020.

RIO DE JANEIRO (Estado). Decreto nº 46.973, de 16 de março de 2020.  Reconhece a situação de emergência na saúde pública do Estado do Rio de Janeiro em razão do contágio e adota medidas enfrentamento da propagação decorrente do novo coronavírus (COVID-19); e dá outras providências. Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro de 17 mar. 2020. Disponível em:https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=391123. Acesso em: 13 mai. 2020.

RIO DE JANEIRO (Estado). Decreto nº 47.052, de 29 de abril de 2020. Dispõe sobre as medidas de  enfrentamento da propagação decorrente do novo Coronavívirus (COVID-19), em decorrência da situação de emergência em saúde e dá outras providências.  Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro. 30 de abril de 2020. Disponível em: http://www.fazenda.rj.gov.br/sefaz/content/conn/UCMServer/path/Contribution%20Folders/site_fazenda/Subportais/PortalGestaoPessoas/Legisla%c3%a7%c3%b5es%20SILEP/Legisla%c3%a7%c3%b5es/2020/Decretos/DECRETO%20N%c2%ba%2047.052%20DE%2029%20DE%20ABRIL%20DE%202020_MEDIDAS%20DE%20ENFRENTAMENTO%20DA%20PROPAGA%c3%87%c3%83O%20DO%20CORONAV%c3%8dRUS%20COVID_19.pdf?lve. Acesso em 11 mai.  2020.

 


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